• "Um blog do cacete!" - Folha de São Paulo

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    segunda-feira, agosto 29

    Até brilha!


    "Sou pequeno mas não me sinto um Calimero." - António Vitorino in Notas Soltas, RTP

    Ninguém diria...

    sábado, agosto 27

    Guy du Lait: o homem e a lenda

    Quando ouço falar da contribuição que tanto político ou personalidade tenta dar no sentido de criar um Portugal melhor (e aqui chamo especialmente à atenção para o episódio compreensivelmente mediático em que Lili Caneças, num laivo de inultrapassável generosidade, ofereceu roupa de marca a pequenas ciganitas), fico sempre sentido ao reparar na ausência imperdoável do nome de Guilherme Leite. Longe de ser apenas mais um nome no elenco dos Malucos do Riso e daqueles programas da manhã que ninguém com menos de 60 anos sabe como se chamam, Guilherme Leite é um nome que reflecte integridade e valores morais.
    Num desses programas da manhã que ninguém com menos de 60 anos sabe como se chamam, este actor explicou de forma clara e sucinta a sua estratégia de representação. Aludiu ao facto de o excelente humor de prime time que integra os Malucos do Riso não ser válido num programa cujo universo de espectadores se resume aos cidadãos reformados, obrigando portanto a uma reformulação da comédia a adoptar. Guilherme referiu ainda que, assim sendo, procura usar o seu humor como arma de solidariedade para com a população idosa, procurando amenizar a agrura da terceira idade e contribuindo para um aumento da qualidade de vida da população. E, como se sabe, a qualidade de vida não tem preço.
    Não obstante o facto de se vestir de mulher-a-dias, varredor ou campónio poder criar um estereótipo desagradável, segundo o qual se concluiria que a população sénior “gosta é dessas coisas do povo”, Gui despe o orgulho que decerto o inunda e enverga o traje da populaça com o único intuito de usar a melhor arma de que dispõe – o seu indiscutível talento para a comédia! – para fazer o Portugal egoísta reparar na miséria que é a velhice. Senão, vejamos, depois de uma vida de trabalho, tudo o que nos resta é uma pensão miserável e ver um palerma na televisão? Não acham que a mensagem é clara? Ponham os olhos nisto e, os que puderem, tentem criar um futuro melhor para o país: um país que, no mínimo, não necessite de humor de merda como bálsamo. E já que se fala tanto de globalização e europeização, que melhor maneira de premiar este profeta, este ghost of christmas future, senão com o título honorífico VICOMTE GUY DU LAIT (na devida língua: aquela que estava em voga no século XIX, o mesmo em que vive Gui).
    Atentem nos exemplos dos heróis nacionais. Senão já sabem: quando se reformarem vai ser a vossa vez!

    Post elaborado com a "mola" d'O mestre. Obrigado por acreditares que este blog ainda pode ir ao sítio!

    terça-feira, agosto 16

    E eu já não sou convocado há muito tempo.

    Há coisa de uns minutos, enquanto estava a jantar, estava a ver na televisão o início do fantástico derby futebolístico Portugal-Hungria. Reparei com especial atenção nos jogadores a cantarem o hino nacional, e depressa concluí que são poucos os que o sabem de verdade.
    Ao início, não pude deixar de questionar se os movimentos que faziam com os lábios eram fruto de uma doença degenerativa grave cujo principal sintoma fosse uma boca balbuciante, e confesso que senti pena dos atletas. Mas depois lembrei-me de mim na missa. Quando não sei a letra da sacra cantoria, não dou parte de fraco ante Nosso Senhor e movo os lábios, fingindo que canto, e como estou rodeado de gente que sabe de facto a letra e canta alto, safo-me bem e as velhas beatas julgam-me um lindo menino.
    Ora, isto é válido para uma igreja cheia de gente onde ninguém tem interesse em olhar para nós. Logo, o restrito universo de aplicação desta técnica não engloba um estádio repleto a olhar para onze homens. Alguém devia fazer notar aos heróis nacionais da bola que se não querem fazer má figura, deviam aprender o hino em casa e não com o jogador do lado, que também não o sabe. É que ao menos na missa toda a gente à nossa volta sabe. E como vamos porque queremos e ninguém nos convoca, não há problema se não soubermos.

    segunda-feira, agosto 15

    Alguma Mafalda.


    Para todos aqueles que já me perguntaram de onde tirei o nome para este blog, aqui vai esta tira do "Toda a Mafalda" do Quino. Esqueçam o que vos disse: o nome veio daqui e de mais lado nenhum.

    Isto é tudo muito bonito mas há já algum tempo que não sei o que isso é.

    Quando surgiram as notas e moedas de Euro, a minha maior preocupação não foi acerca das vigarices a que poderia ser vulnerável, nem sobre a dificuldade de fazer o câmbio mentalmente aquando de uma compra, nem tampouco relativamente à dificuldade que certas pessoas da minha família teriam, por serem idosas, em se habituar à nova moeda. Não, a minha principal preocupação foi encontrar um substituto para o pau. O pau acompanhou-me desde a mais tenra infância, substituindo simpaticamente o escudo frio e bélico pelo pau bonacheirão e amigo. Os paus reduziam o dinheiro àquilo que na realidade é: uma ninharia. O dinheiro é desprezível, fonte de problemas e dores de cabeça, despoleta interesses e lutas, impede-nos de gozar a vida porque precisamos dele para sobreviver e impede-nos de gozar a morte em paz porque os nossos herdeiros nos estão a vasculhar os bolsos e a disputar a herança. O austero escudo estava em sintonia com isto tudo. Já o pau tornava qualquer quantia monetária insignificante e desprezável, o que faz ainda mais sentido se nos recordarmos que só se falava em paus se se estivesse a falar de montantes pequenos.
    A título de exemplo: eu ainda me lembro de quando um café custava 50 paus, de quando uma maquinada custava 50 ou 100 paus e de quando se punha 500 paus de gasosa na mota e dava para uma semana.
    Ora, como o pau iria desaparecer com a entrada do euro, bem como tudo o que ele representava, já se percebe a minha preocupação. As dúvidas começaram a surgir-me: será que se chamarão paus aos cêntimos? Ou será aos euros? Será que se conseguirá arranjar um substituto credível para o pau? Ao fim de uns anos de convivência com a nova moeda, fico feliz em anunciar algumas das alcunhas para o euro que, não estando obviamente à altura do brilhante pau, traduzem imaginação e vontade de trabalhar no sentido de pôr o dinheiro no lugar dele*. Temos então os seguintes sinónimos de “euros”:

    eurémios
    euricos
    érios
    heróis
    ouros
    oiros
    oreos
    érimos
    aurélios.

    A necessidade é, efectivamente, a mãe da invenção.

    * No meu bolso. (Sim, isto é tudo tanga: eu falo, falo, mas quem me cá dera muito mais dinheirinho.)

    E uma vez comi iogurte de Aloe Vera: não me queiram perguntar o que é que aquilo parece.

    Há coisa de uma semana estive sozinho em casa durante uns dias, pelo que tive que vestir o avental e me transformar numa mulher-a-dias. A improvisação das minhas pouco nutritivas refeições levou-me ao ex-libris do capitalismo doméstico, o Continente, onde planeava adquirir, entre outros víveres, sumo de laranja. Quando cheguei à “zona dos sumos”

    No Continente as “coisas” estão em “zonas”: zona da fruta, zona dos congelados, zona das lâmpadas, zona dos pensos higiénicos

    deparei-me com uma oferta que decerto fará as alegrias dos produtores mas que só complica a vida a um simplório como eu. O que se passa é que não consegui encontrar sumo de laranja. O mais próximo que encontrei foi sumo de laranja e cenoura, e como teimei que queria só de laranja, então só ia levar de laranja, isto é o Continente, porra!. Claro que durante 30 segundos achei estranho não haver à vista o sumo mais básico de todos, mas uma análise mais detalhada do escaparate permitiu-me perceber o porquê: já não existem sumos de um sabor apenas. Em contrapartida, esses aborrecidos sumos monocromáticos deram lugar a sumo de laranja e cenoura, manga e pêssego, laranja e ananás, banana e morango, e muitos outros mais, entre os quais o lugar de destaque vai para o néctar de maçã, limão e ginkgo biloba.

    Ginkgo biloba? Vocês não sabem mesmo quando parar, pois não?

    O vórtice de paladares líquidos depressa me fez perder os sentidos, a razão e a esperança, pelo que acabei por levar uma limonada industrial que trazia em suspensão os bocados de limão que na limonada caseira são bons mas naquele caso particular pareciam – e sabiam – a pequenas unhas frágeis. E ainda lá está, no meu frigorífico.